Segunda-feira – XVIII Semana – Tempo Comum – Anos
Ímpares
Primeira
leitura: Números 11, 4b-15
A caminhada
de Israel pelo deserto, narrada nos livros do Êxodo e dos Números, justapõe
episódios relativos à carência de comida e bebida, a perigos próprios de uma
região inóspita, a reacções de rebeldia e de murmuração, a intervenções de Deus
diante das carências e das rebeliões.
O povo, mais do que olhar para a salvação
alcançada, para o dom gratuito de Deus, olha para trás com saudades do Egipto e
dos bens de que lá dispunha, esquecendo os sofrimentos. Parecia-lhe melhor
continuar escravo no Egipto que livre no deserto, a comer o maná, que não
enchia os estômagos. Israel é um povo descontente, incapaz de reconhecer os
dons de Deus: a liberdade e o pão descido do céu.
Moisés, ligado ao destino desse povo, entra em crise e
barafusta com Deus. É a sorte do
mediador, que deve identificar-se com o destino do povo, permanecendo fiel a
Deus.
A lamentação de Moisés, significativa no seu realismo, antecipa as
lamentações dos salmos e dos Profetas. Moisés, amigo de Deus, pode barafustar
com Ele, que é o verdadeiro Senhor do povo. A sua audácia leva-o a pôr em causa
a fidelidade paterna e materna de Deus e a suplicá-la com arrojo.
Evangelho:
Mateus 14, 13-21
A notícia da
morte de João Baptista leva Jesus a afastar-se da multidão, para escapar à
presumível tentativa de O matarem, também a Ele, já alvo de conjura por parte
dos fariseus. Mas, fiel à missão que o Pai Lhe confiou, responde com amor à multidão, que Lhe pede gestos de salvação:
cura os doentes, que Lhe são apresentados, e sacia a fome dos que O seguem. Mas
exige a participação dos discípulos, que
são chamados a dar-se a si mesmos, e a pôr em comum o que têm.
A narrativa
deste milagre antecipa, na intenção do evangelista, o da instituição da
Eucaristia (cf. Mt 26, 26). Os discípulos serão ministros, distribuindo aos
outros o pão que Jesus lhes dá. Do mesmo modo que sobrou pão, quando Eliseu,
com vinte pães saciou cem pessoas (cf. 2 Rs 4, 42-44), assim também, e de modo
ainda mais significativo, sobraram doze cestos, depois da refeição miraculosa
oferecida por Jesus. Tinham chegado os dias messiânicos.
Jesus, o Messias,
satisfazia todas as necessidades humanas, fazendo curas e saciando os que
tinham fome. Na comunidade, fundada por Jesus, desaparecem toda a doença e toda
a necessidade.
Entrevemos
nas leituras de hoje uma unidade temática.
No deserto, os Israelitas protestam
e lamentam-se. A dura opressão, sofrida no Egipto, foi transformada na
recordação de uma existência quase paradisíaca: «Lembramo-nos do peixe que
comíamos de graça no Egipto, dos pepinos, dos melões, dos alhos-porros, das
cebolas e dos alhos. Agora, a nossa garganta está seca; não há nada diante de
nós senão maná» (vv. 5-6). Não estão satisfeitos com a porção de maná que, cada
dia, Deus lhes envia.
As lamentações
do povo são «um peso» para Moisés, que,
por sua vez, se lamenta com Deus:
«Porque atormentas o teu servo». O grande
chefe sente-se de tal modo abatido que chega a pedir a morte: «Se me queres
tratar assim, dá-me antes a morte».
É fácil ceder à saudade do passado, quando nos deixamos guiar, não
pelo espírito de fidelidade à aliança com Deus, mas pelos nossos instintos
fortes, como podem ser a fome e a sede.
Os Padres da
Igreja sempre viram na caminhada de
Israel através do deserto um
paradigma do itinerário do cristão e da Igreja.
O futuro assusta. O
alimento ligeiro do espírito não é suficiente, as saudades do passado
atraiçoam, e as exigências de Deus nem sempre são bem compreendidas.
Cada
cristão passa pelas suas provações. Mas ai de quem se fixa no passado! Há que
acolher, agradecidos, o alimento quotidiano, ainda que seja leve como a Palavra
de Deus, e o pão e vinho eucarísticos.
O evangelho
apresenta-nos Jesus, qual novo Moisés no deserto, no meio de uma multidão
cansada, faminta, doente. Esta multidão sente dificuldades em seguir o Messias.
Mas é dele que espera tudo, incluindo a libertação política. Jesus corresponde
aos seus anseios de modo eficaz e milagroso. Mas os sinais realizados, tal como
a sua pessoa, devem ser acolhidos na fé. De facto, Jesus vive em comunhão com o
Pai, mas também com os discípulos, com quem partilha tudo. O maná quotidiano,
da Palavra e da Eucaristia, é alimento para o caminho, o viático para a
jornada.
Deixemo-nos
guiar por Jesus, novo Moisés, e acolhamos agradecidos os alimentos da Palavra e
da Eucaristia que nos dá.
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