Sábado – III Semana – Tempo Comum –
Anos Pares
27 Janeiro 2018
Primeira leitura: 2 Samuel 12, 1-7a.10-17
Morto Urias, David tomou para si Betsabé. Tudo parecia
correr bem a David. Mas Deus está atento e vê tudo, não só os planos mais
secretos do homem, mas também o que se passa no seu coração. Natan, enviado por
Deus ao rei, denuncia-lhe os crimes, recorrendo à célebre parábola do homem
rico, que toma para si a única ovelha do seu vizinho pobre. David, rei justo,
não hesita em pronunciar, indignado, a sentença condenatória. Só que o profeta
remata, dizendo: «Esse homem és tu!». David reconhece o seu pecado e a súplica
de arrependimento, que brota do seu coração, encontra expressão no Salmo 50, acertadamente
posto na boca do rei pecador.
Mas o drama continua. Deus perdoa a David. Todavia a oração, que brota dos lábios de David, revela, não só o seu amor pelo filho, e por Betsabé, mas também a confiança do rei na oração: clama, geme, jejua, prostra-se por terra e tenta forçar, qual novo Abraão, a misericórdia de Deus.
Se o pecado ou, melhor, os vários pecados de David nos
deixaram horrorizados, o seu arrependimento sincero causa-nos admiração.
Deus serviu-se de Natan, e da sua sábia pedagogia,
para levar o rei a reconhecer o seu pecado. David escuta a história do homem
rico, abençoado por Deus com muitos rebanhos, e que, para oferecer uma refeição
a um amigo que o visita, rouba a única ovelha de um homem pobre. Como rei
justo, não hesita em pronunciar a sentença: «Pelo Deus vivo! O homem que fez
isso merece a morte. 6Pagará quatro vezes o valor da ovelha, por ter feito essa
maldade e não ter tido compaixão» (2 Sam 12, 5-6). É nesse momento que o
profeta pronuncia a sua acusação: «Esse homem és tu!» (2 Sam 12, 7). Ele,
David, era o criminoso que acabava de condenar. Ele, que Deus cumulara de bens,
tinha roubado o único tesouro de Urias, a sua mulher. Natan, enviado de Deus,
levou o rei a tomar consciência do seu crime, e anunciou-lhe o castigo. David
não tentou desculpar-se ou fugir à condenação mas confessou: «Pequei contra o
Senhor» (2 Sam 12, 13). Assim alcançou o perdão dos seus pecados e uma nova
relação com o Senhor, bem expressa o Salmo 50.
As fragilidades, as incertezas, as dúvidas, o pecado,
não são coisas só dos «outros». São também nossas. Também nós somos discípulos
assustados e medrosos! Também nós somos pecadores como David.
Um monge do deserto disse que o primeiro degrau para ascender à santidade é reconhecer-se pecador. Esse reconhecimento é já resposta a uma graça, pois não seria possível sem a ajuda de Deus. É um modo de agir da sua misericórdia, que, para isso, às vezes se serve de um acontecimento ou da intervenção de alguém com quem nos encontramos e que, com uma palavra, nos leva a abrir os olhos para a nossa realidade. Se acolhermos essa graça, podemos iniciar uma nova fase de crescimento espiritual.
Deus é Pai. Deus é amor… e nunca é tão Pai e tão amor como quando perdoa. Pensemos, comovidos, na parábola do filho pródigo ou, melhor, do Pai pródigo na bondade, na misericórdia, no perdão, no amor.
Um escritor moderno disse muito bem: “Se não fôssemos
pecadores, carecidos de perdão mais que de pão, não conheceríamos a
profundidade do coração de Deus”
Abre, Senhor, os meus olhos, para que veja a minha
fragilidade, o meu orgulho, o meu pecado. Quantas vezes, me sinto justo como
David prepotente e pecador. Quantas vezes, me sinto vaidoso porque navego numa
barca onde Tu estás presente, a Igreja, contra a qual não hão-de prevalecer as
portas do inferno, como se isso fosse uma garantia e uma graça que eu mereço.
Ensina-me que o Evangelho é uma graça a partilhar, e não um tesouro a guardar
só para mim. Ampara-me nas tentações e dificuldades, para que não me julgue
abandonado pelo teu poder e esquecido do teu amor.
Evangelho: Mc 4, 35-41
É interessante notar o contraste entre a serenidade de
Jesus, que dorme, e a ansiedade dos discípulos, que lutam bravamente contra as
ondas e o vento. Parecem inverter-se os papéis: Jesus confia nos marinheiros e
estes, angustiados, não revelam confiança em Jesus: «não te importas que
pereçamos?» (v. 38).
Quando Jesus
finalmente intervém, calam-se o vento e o mar, e calam-se os aterrorizados
marinheiros. Nem respondem às perguntas de Jesus: «Porque sois tão medrosos?
Ainda não tendes fé?». O medo dos discípulos indica falta de fé. A intervenção
de Jesus transforma-lhes o medo em temor de Deus. O poder manifestado por Jesus
fê-los intuir a presença de Deus junto deles. E começam a dar-se conta da
verdadeira identidade do seu Mestre.
A nossa familiaridade com Deus, não nos põe ao abrigo
de momentos de hesitação e de dúvida, como nos mostra o evangelho. Podemos até
cair na ilusão de que, tendo-O por companheiro, Ele nos livra de situações
difíceis. Os discípulos talvez tivessem caído nessa ilusão. Uma tempestade
forte fê-los acordar, pondo em crise a sua confiança no Mestre: «não te
importas que pereçamos?»
Quantas vezes, no aconchego da comunidade bem organizada, protegidos pela assiduidade aos ritos, nos sentimos tranquilos e ao abrigo de situações difíceis. «O Senhor está connosco; que nos pode acontecer?» – pensamos. E julgamos ter muita fé e muita confiança em Deus. Mas, à primeira dificuldade, ao primeiro fracasso, repreendemo-lo, como se nos tivesse abandonado.
Fonte:
Adaptação e resumo de um texto de “dehonianos.org/portal/liturgia”
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