SEXTA-FEIRA DEPOIS DAS CINZAS
Primeira leitura: Isaías 58, 1-9a
Neste
discurso, o profeta pretende alertar o povo para a falta de autenticidade com
que vive (vv. 1-3a), proclamar o verdadeiro jejum (vv. 3b-7) e
indicar as consequências positivas da ligação do jejum à prática da justiça
(vv. 8-12).
O
povo tinha regressado do exílio cheio de entusiasmo e de esperança. Mas as
dificuldades eram grandes. Deus parecia surdo e indiferente às súplicas e ao
culto do seu povo. Mas o profeta alerta para a prática de um jejum misturado
com injustiças sociais, e condena-o.
O
culto deve estar unido à solidariedade com os pobres. Caso contrário, não
agrada a Deus e é estéril. As manifestações exteriores de conversão têm a sua
prova real na caridade e na misericórdia para com os pobres e oprimidos. Isaías
parece já ter ouvido as palavras de Jesus:
«Tinha
fome e destes-me de comer … (cf. Mt 25, 31-46).
Mas
afirmar que o verdadeiro jejum e o verdadeiro culto consistem na caridade, não
significa negar o valor dessas práticas, mas afirmar que elas têm sentido e
valor em vista da mesma caridade.
O
jejum tem sentido e valor quando se torna expressão de amor a Deus e ao
próximo. Por sua vez, o verdadeiro culto é relação com Deus, sem individualismo
e falsidade.
Evangelho: Mateus 9, 14-15
Os
discípulos de Jesus são acusados de não Jejuarem. Jesus responde dando a
entender que, com Ele, começaram os tempos messiânicos, o tempo das núpcias, o
tempo escatológico anunciado pelos profetas, tempo de alegria durante o qual
não se jejua, pois o Esposo está presente.
Mas
muitos não conseguem ver em Jesus o Messias esperado, e não reconhecem que o
Reino de Deus é festa, é pérola pela qual se está disposto a deixar tudo com
alegria.
A
renúncia, por Deus, não é um peso. Não há que ter medo do rosto alegre do
Senhor. O jejum cristão não consiste apenas em abster-se de alimentos.
Consiste, sobretudo, em desejar o encontro com Jesus salvador.
O
contexto deste evangelho ajuda-nos a compreendê-lo. Nos versículos seguintes
Jesus recorre a duas comparações:
«Ninguém
põe um remendo de pano novo em roupa velha.. 17Nem se deita vinho novo em odres
velhos. »(vv. 16.17),
que oferecem outra motivação em favor do
comportamento dos discípulos de Jesus. Com a vinda de Jesus, começou o tempo
novo do Reino em que já não se sentem prisioneiros do jejum ou de outras
práticas da Antiga Aliança.
A
novidade de Cristo não se limita a adaptar as velhas formas: arranca o pano
velho, rebenta os velhos odres. Há um novo começo.
O
jejum começa a reentrar na nossa cultura actual por razões de dieta e de
estética, ou aconselhado por certas formas de religiosidade, com origem no Oriente.
A
Igreja, como sempre, também recomenda o jejum, particularmente na Quaresma.
Mas
podemos entender mal as suas motivações ou até cair no egoísmo e do orgulho.
Por isso, a mesma Igreja, nos alerta para duas dimensões essenciais do jejum: a
sua referência a Cristo e a sua dimensão de solidariedade.
Expliquemos:
jejua-se porque Cristo, o Esposo, ainda não está totalmente presente em cada um
de nós nem na sociedade em que vivemos. O Esposo está pronto. Mas nós não
estamos prontos.
Ainda
não nos deixamos invadir completamente pelo seu amor. Jejuamos para Lhe dar
lugar em nós, para que possa ocupar toda a nossa existência.
Jejuamos
para nos unirmos à sua Paixão. Já no século II era recomendado aos fiéis que
não jejuassem nos mesmos dias em que jejuavam os judeus, mas sim na
sexta-feira, em memória da paixão de Jesus.
Mas
também jejuamos para nos tornarmos sensíveis à fome e à sede de tantos irmãos e
para assumirmos a nossa responsabilidade na resolução dos problemas dos pobres
e carenciados.
A
memória da paixão de Jesus não é um simples ritual, mas um acto de
misericórdia, no sentido da palavra do Senhor:
«Prefiro
a misericórdia ao sacrifício» (cf. Mt 9, 13).
A
sua paixão é obediência ao Pai, mas também um gesto de extrema caridade, de solidariedade
com todos nós.
Tendo
bem presentes estas dimensões, entendemos melhor o sentido do jejum que nos é
recomendado e pedido pela Igreja, e mais facilmente evitamos cair na busca de
uma perfeição individualista e fechada, sem nos preocuparmos com os outros.
Deixemo-nos
conduzir pelo Espírito nas formas de ascese a escolher para vivermos
proveitosamente a nossa Quaresma. E sucederá connosco o que sucedeu com Jesus:
"O Espírito do Senhor está sobre Mim –
diz Jesus na sinagoga de Nazaré – … enviou-Me a anunciar a boa nova aos pobres
… e a pregar um ano de graça do Senhor’ (Lc 4,18-19; Cf. Cst 28).
Amar
um pequeno, um pobre, é amar Jesus:
"Todas as vezes que fizeste isto (as
obras de misericórdia) a um só destes meus irmãos mais pequenos, foi a Mim que
o fizestes" (Mt 25, 40).
O
tempo da Quaresma é propício a percorrermos os diversos graus da caridade
evangélica:
"Ama
o próximo como a ti mesmo" (Mt 19, 19).
É a
regra de ouro que já foi proclamada no Antigo Testamento e que Jesus faz Sua:
não faças aos outros o que não queres que te façam a ti (Cf. Mt 7,12); Lc 6,11;
Lv 19,18; Tob 4,15). Este é o primeiro grau da caridade.
O
segundo grau é: ama o próximo como amas a Jesus (Cf. Mt 25, 40; cf. n. 28).
O
terceiro grau é amar o próximo como Jesus nos ama:
"Este
é o Meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como Eu vos amel’ (Jo 15,12).
O
quarto grau, o mais perfeito, é revelado por Jesus em forma de oração: pede que
os seus discípulos se amem uns aos outros como as Três Pessoas da SS. Trindade
se amam:
"Não
rogo só por estes, mas também por aqueles que, graças à sua palavra, hão-de
acreditar em Mim, para que todos sejam um. Como Tu, ó Pai, estás em Mim e Eu em
Ti, sejam também eles uma só coisa, para que o mundo creia que Tu Me
enviaste" (Jo 17,20-21).
O
fruto da caridade é Jesus presente no meio de nós:
"Onde
dois ou três estiverem reunidos em Meu nome, Eu estarei no meio deles" (Mt
18, 20).
Mas
o preço da caridade é sempre a cruz, a negação de nós mesmos, a superação do
nosso egoísmo:
"Se
alguém quiser vir após Mim, renegue a si mesmo, tome a sua cruz cada dia e
siga-Me" (Lc 9, 23).
Fonte: Adaptação local de um texto de “dehonianos.org/portal/liturgia”
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